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23 janeiro, 2010

A batalha da Balança



Porque é que uns são gordos e outros magros? Porque é que uns engordam com facilidade e outros comem muito e ainda emagrecem? As respostas estão nas engrenagens da máquina humana.





Recentemente, ao completar 50 anos, um responsável pai de família resolveu fazer um seguro de vida. “Nunca se sabe o que pode acontecer”, raciocinou, sensatamente. Dirigiu-se então a uma companhia de seguros indicada por um amigo. Escolhido o plano de pagamento, o cliente assustou-se com a quantia que teria de desembolsar todos os meses. “Mas isso é muito mais do que meu amigo paga, no mesmo plano”, reclamou. O motivo logo foi-lhe explicado. Como ele não só pesava 30 quilos a mais do que o amigo mas também estava muito acima da média de peso de pessoas do seu tipo físico, o acréscimo era inevitável.
A ideia de cobrar mais caro pelos seguros de pessoas com excesso de peso surgiu nos Estados Unidos há alguns anos, devido à descoberta de que as pessoas gordas são mais suscetíveis a doenças, algumas das quais podem apressar a sua morte. Entre os males que geralmente acompanham o excesso de gordura, destacam-se os problemas: cardiovasculares, principalmente a aterosclerose - entupimento das artérias causado por hipertensão ou por aumento do nível do colesterol, ambas complicações associadas ao excesso de gordura - , e a insuficiência cardíaca. Tendo conhecimento desses dados, as companhias de seguros foram criando, com a ajuda de especialistas, tabelas de correspondência entre o peso, a altura e o sexo de um indivíduo. A ideia era estabelecer uma base para o peso ideal de cada um, segundo um conjunto de características biológicas e físicas.


Essas tabelas são aceites pelos médicos como uma referência confiável para avaliar a "quantas" andam os seus pacientes em matéria de peso, mas elas não se destinam a esclarecer as causas das enormes diferenças que pode haver entre as pessoas nesse particular. Porque é que uns parecem viver permanentemente em regime de greve de fome e ainda assim perdem todas as batalhas contra a balança? E porque é que outros se deliciam, sem sentimentos de culpa, com uma porção extra de torta de chocolate e ainda assim permanecem esbeltos? A Medicina tem uma tonelada de respostas para dúvidas desse gênero. Mas, como acontece com muita gente em relação ao próprio peso, os cientistas não estão satisfeitos com o que sabem.
De facto, é difícil saber: não faltam enigmas por trás dessa questão aparentemente simples. O peso é um traço característico de uma pessoa, assim como a altura ou a cor dos olhos. A sua constância, em condições normais de saúde, é um prodígio da natureza. Exprime o equilíbrio entre as entradas e saídas de energias no organismo, como o extrato de uma conta bancária em que débitos e créditos estão bem administrados.

Por exemplo: se não houvesse um consumo equivalente de energia, uma colherzinha de açúcar a mais por dia acarretaria, ao fim de trinta anos, um aumento de peso de 20 quilos. O segredo da constância de peso num indivíduo saudável está na constância de certa quantidade de gordura no corpo. Nome genérico dado a substâncias como o glicerol e os ácidos graxos, a gordura habita células específicas, chamadas adipócitos, que constituem o tecido adiposo (de adipe, gordura em latim). O obeso é aquele cuja massa adiposa representa mais de 20 por cento do peso do corpo (25 por cento no caso das mulheres). Sob a forma de gordura, o tecido adiposo armazena 95 por cento das reservas energéticas do organismo. Os outros 5 por cento são supridos pelas reservas de glicogênio - um derivado da glicose - existentes no fígado e no tecido muscular. Embora seja o responsável pelos volumes e saliências que, geralmente concentrados em volta da cintura, fazem a infelicidade de tanta gente, o tecido adiposo é também o que torna os corpos mais atraentes, modelando as formas ao rechear os espaços entre ossos e músculos.

Para manter constante o peso, o organismo deve, portanto, gastar tudo o que ganha por meio dos alimentos. Se todos gastassem por igual, a questão resolveria-se com uma simples operação aritmética: gordos seriam aqueles que comem mais do que precisam, e magros, os que comem menos. É lógico que comer demais está na base de todo excesso de peso, mas há situações em que a fisiologia desarruma a lógica. No caso dos magros que comem muito e dos gordos que se alimentam muito mal, o problema não parece ser o que entra em forma de alimento, mas o que sai em forma de energia. Todos os nutrientes contidos nos alimentos e bebidas que o homem ingere são utilizados para fazer o organismo funcionar.

Proteínas são transformadas para a produção de hormonas e enzimas; carboidratos - os açúcares - são queimados para a produção de energia; as gorduras - ou lípidos - vão constituir a reserva adiposa. As reações bioquímicas que ocorrem nos processos de digestão, absorção e armazenamento dos nutrientes são extremamente complexas, mas todas estão a serviço de uma nobre causa: como dizem os médicos, o organismo deve manter o seu equilíbrio homeostático. Isto é, precisa conservar o seu meio interno constante, ao mesmo tempo que gere suas economias. O corpo humano é um modelo de avareza: tudo o que sobra do processo de digestão dos alimentos será transformado em gordura e em glicogénio. Esse potencial energético fica inteiro à disposição do organismo, até que este resolva utilizá-lo em situações de grande necessidade de calorias.

O gasto total de energia de um indivíduo - homem ou mulher, jovem ou velho - resulta de três fatores: o metabolismo basal, a termogénese e as actividades físicas. O metabolismo basal representa o gasto de calorias de uma pessoa em jejum e em repouso. É a energia requerida para as actividades necessárias à sobrevivência do organismo, como a respiração e os batimentos cardíacos. O metabolismo basal varia com a quantidade de chamada massa corpórea magra. Essa massa, formada pelos músculos e por outros órgãos, é que depende da energia para desempenhar suas funções biológicas. Quanto mais massa corpórea magra, maior será a energia despendida no metabolismo basal.
Esse factor também pode variar com o sexo e a idade. Os homens apresentam um metabolismo basal mais elevado (medido a partir da respiração), já que possuem maior quantidade de massa corpórea magra do que as mulheres. Os mais jovens, igualmente, gastam mais para manter suas funções vitais do que as pessoas de meia-idade e os velhos, que já alcançaram a maturidade física e não precisam despender muita energia. Em condições normais, 73 por cento do consumo de energia pelo organismo destina-se ao metabolismo basal. O resto é dividido entre os outros dois fatores. As actividades físicas ficam com 12 por cento e a termogénese com 15 por cento dos gastos calóricos do corpo.
A termogénese, por sua vez, é a energia consumida durante a digestão, a absorção, o transporte e a utilização dos nutrientes. A absorção intestinal, por exemplo, consome cerca de 3 por cento da energia fornecida pelos alimentos durante uma refeição. A estocagem de gordura no tecido adiposo custa 2 por cento e a conversão de glicose em glicogénio para o fígado consome algo como 6 por cento da energia total. A variação de temperatura também exige um maior ou menor dispêndio de energia. Quando está frio, o organismo deve gastar mais para manter a temperatura interna constante. Já em temperaturas mais altas, isso não é necessário. A termogénese ainda pode variar de acordo com o estado psicológico.

Situações de stresse, por exemplo, fazem com que o organismo gaste mais energia para funcionar. Por isso é comum pessoas em períodos emocionalmente difíceis perderem peso, ainda que se alimentem como sempre. Mas o contrário também pode acontecer, quando se passa a comer mais como forma de compensação psicológica numa situação de crise. Trata-se, segundo o psiquiatra Sérgio Bettarello da Universidade de São Paulo, de um comportamento aprendido na infância: “Se a mãe alimenta o filho toda vez que ele chora, a comida pode virar um substituto para outra emoções”.

Um importante mecanismo de queima das reservas adiposas do corpo é comandado pelo hipotálamo, uma pequena região em forma de funil, situada na base do cérebro. A queima depende da liberação de uma hormona chamada noradrenalina, que age directamente sobre o tecido adiposo. Quando a hormona chega ali, transportada pela corrente sanguínea, é reconhecida por outras substâncias que, a partir de então, desencadeiam o processo de queima das gorduras, transformando-as em energia. Qualquer desequilíbrio na delicada trama que regula as entradas e saídas de energia pode ser o responsável pelo facto de alguém ser gordo ou magro.

Segundo o endocrinologista Alfredo Halpern, da USP, existem pessoas que apresentam um déficit calórico nos gastos de energia, isto é, nelas, o organismo desempenha suas funções muito economicamente, poupando energia. Essas pessoas, fatalmente, acabam por engordar. Hoje em dia, estudos em vários países tenta localizar esse déficit e identificar suas causas. Algumas pesquisas dizem que o déficit está nos mecanismos da termogénese. Isso pode acontecer no caso de pessoas que gastam menos energia ao se alimentar. “São indivíduos que aproveitam melhor os alimentos, devido a uma causa não muito bem esclarecida”, diz Halpern. Essa causa pode estar na intrincada rede de reacções químicas envolvidas nesses processos.
Os cientistas já conseguiram demonstrar, por exemplo, que a hiperfagia - a vontade irresistível de comer - pode estar relacionada às substâncias liberadas pelo hipotálamo. De facto, é nessa parte do cérebro que se localizam dois centros importantíssimos para o processo de alimentação: os centros da fome e da saciedade. Ao contrário do que pode parecer, fome e saciedade não são duas faces da mesma moeda. A necessidade de ingerir comida, de um lado, e a satisfação provocada por certa quantidade de alimento, de outro, são duas sensações distintas, geradas em locais diferentes do hipotálamo. As pesquisas mostram que ambas as sensações dependem de uma infinidade de estímulos químicos e hormonais desencadeados dentro ou fora do organismo.

A hormmona noradrenalina, por exemplo, age no centro da fome, diminuindo a sua intensidade, enquanto outra hormona, chamada serotonina, age no centro da saciedade, aguçando esta sensação. Existem evidências de que certas pessoas com problemas de excesso de peso apresentam níveis menores de serotonina no centro da saciedade. Isso faz com que elas nunca se sintam plenamente satisfeitas por mais que se alimentem. Outras pesquisas, relacionadas às actividades físicas de gordos e magros, são motivo de controvérsia. Os cientistas já observaram que os gordos geralmente têm menos actividade do que os magros - entendendo-se por actividade física tudo que se faz com o corpo.
A observação tem sentido. Afinal o trabalho que os gordos devem fazer é bem maior, pois o esforço é directamente proporcional à massa que carregam. Mas também essa regra tem suas excepções. Existem gordos superativos que, apesar de toda a movimentação, mantêm os seus quilos. E existem os magros sedentários, que, apesar da aversão por qualquer tipo de actividade física, mantêm-se esbeltos e saudáveis. Uma pista importante para se compreender melhor parte desses aparentes contra-sensos surgiu recentemente nos Estados Unidos: pesquisadores verificaram que pessoas mais gordas apresentam menos movimentos involuntários do que as outras. O conjunto desses movimentos, denominado fidgeting (inquietar-se, agitar-se em inglês), inclui actos, como coçar a cabeça, cruzar e descruzar as pernas, acender um cigarro ou andar de um lado para o outro.
Onde quer que ocorram, os desequilíbrios no processo de ganho e perda de energia talvez tenham uma causa anterior. Assim, as respostas às questões envolvendo obesidade estariam codificadas nas sequência de DNA - a bagagem genética de todo ser vivo - presente nos cromossomos das células. Embora os estudos sobre o assunto sejam indirectos - lidam com famílias e gêmeos, por exemplo, mas não investigam o que ocorre em nível molecular - os cientistas tendem a acreditar pelo menos que os genes herdados dos pais podem determinar o peso de um indivíduo na vida adulta - algo que, de resto, a observação do senso comum sempre sustentou.

Então, ser gordo ou magro é uma fatalidade contra a qual não adianta lutar? Nem tanto. Embora, como se viu, os filhos de pais gordos apresentem uma grande disposição para imitá-los, isso não é inevitável. Basta que a pessoa vigie o que come - tipo e quantidade de alimentos - durante toda a vida. O que, como se sabe, é mais fácil dizer que fazer. Durante algum tempo, as pesquisas sobre as bases genéticas que influem no peso esbarraram em um problema: os hábitos alimentares da família, ou seja, o facto de uma pessoa ser gorda ou magra poderia mesmo traduzir uma questão de herança, mas não herança genética - e sim dos hábitos alimentares adquiridos desde a infância. Assim, gordos e magros seriam aquilo que aprenderam a comer.
Como em tantas outras áreas da ciência, o que está em jogo aqui é a interminável polêmica sobre o que pesa mais na vida: a hereditariedade ou o ambiente. Os partidários da primazia genética citam estudos em países escandinavos com filhos adotivos: eles têm, em adulto, maior correspondência de peso com os pais biológicos do que com os que os adoptaram, não importam quais tenham sido os hábitos alimentares da casa em que foram criados. A rigor, os filhos parecem ter maior correspondência de peso com suas mães biológicas - o que fornece uma arma aos defensores do factor ambiente. Pois, para eles, isso prova que o peso, em última instância, seria determinado pelo tipo de nutrição recebido pelo feto.


por Marcelo Macca

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